A Assembleia Legislativa aprovou um projeto de lei que autoriza o Paraná a receber lixo de outros estados. A proposta polêmica revela o que pode ser uma articulação para favorecer empresas do setor, que tem entre sócios os filhos do presidente da Assembleia, Ademar Traiano, e do deputado Plauto Miró, ambos da base do governo Ratinho.
O texto avançou no começo da semana. A própria base aliada do governo derrubou o veto de Ratinho Junior para passar o projeto de autoria do deputado Tião Medeiros. Na prática, a lei cria nova regras para aterros sanitários e tratamento de resíduos.
Ratinho havia vetado o trecho da lei que permite que o Paraná passe a receber lixo vindo de outros estados.
Só que por 29 votos a 13, os deputados derrubaram os vetos e colocaram o governo no canto da vergonha, mostrando que – sobre os interesses dos parlamentares, o governador não tem nenhum controle. A derrubada do veto também é simbólica, porque até agora desde o início da gestão, 99% dos vetos de Ratinho foram respeitados pela ALEP.
Entre os que aprovaram o recebimento de lixo de outros estados, está o ex-secretário de Desenvolvimento Sustentável de Ratinho Junior, deputado Márcio Nunes (PSD), que se afastou do cargo para concorrer as eleições deste ano.
Ademar Traiano, por ocupar o cargo de presidente da assembleia, não votou a proposta. Mas do centro da mesa, ele fez algo que não foi nada comum em seu mandato: pedir para que os deputados votassem “não” e derrubassem o veto do governador.
“Esta presidência também faz um apelo pelo voto ‘não’ [ao veto]”
Ademar Traiano, presidente da ALEP
A maioria dos votos pela derrubada do veto veio justamente da base de apoio a Ratinho Junior e doze deputados decidiram não votar.
EMPRESA LIGADA À COLETA
O presidente da Assembleia Legislativa, Ademar Traiano, tem na família uma empresa ligada à coleta, transporte e tratamento de lixo.
E é o filho do deputado, Ademar Luiz Traiano Junior, que representa legalmente a empresa MTX Ambiental LTDA. A companhia ainda tem como sócia a Pegassus Administrações e Participações LTDA, que consta registrada no nome de três filhos de Traiano: Gabriela e Vinícius, além do já citado Ademar Junior.
Curiosamente, na sociedade com a MTX, também aparece a empresa Surubim Participações LTDA, que são administradas pelos filhos de outro deputado: Plauto Miró, do União Brasil. Plauto também integra a base governista, e votou pela derrubada do veto;
Plauto Miró Neto é administrador da empresa Surubim. Conrado Miró Guimarães aparece como outro sócio, e a filha menor de idade tem como representante o pai.
Na página da internet da MTX, dos filhos de Plauto e Traiano, as atividades são descritas como: solução em gerenciamento, destinação e tratamento de resíduos. Ou seja, a empresa coleta e trata o lixo doméstico e o produzido por indústrias.
CONTRATOS COM PREFEITURAS
Em um levantamento feito junto a prefeituras por meio do Portal da Transparência, também fica evidenciado que a MTX já teve 39 contratos com 14 municípios desde 2014. No total, os contratos renderam mais de R$ 9 milhões à companhia.
Ademar Traiano disse em nota que não tem relação comercial com as empresas que atuam no setor de resíduos sólidos, e que, como presidente da Assembleia, não vota e nem é autor do projeto que foi a plenário.
A reportagem também tentou contato com Plauto Miró e os outros 28 deputados que votaram pela derrubada do veto, buscando explicações do motivo qual o levaram a tomar a decisão, e até o momento não houve resposta.
O deputado Plauto Miró disse à RPC que votou seguindo a orientação do líder do governo, porém Marcel Micheleto (PSD), líder do governador na ALEP, se manifestou em plenário antes da votação e fez um apelo para que o veto não fosse derrubado, mas liberou a bancada para votar como quisesse. Apesar do apelo ele não foi seguido pelos demais parlamentares.
Miró não comentou a participação dos filhos na empresa que pode ser beneficiada pela lei, e salientou ainda não ser o autor do projeto.
INDEPENDÊNCIA DOS PODERES
O governo, por sua vez, se posicionou dizendo que Ratinho Junior respeita a independência dos Poderes, e que entende que divergências da base são naturais ao processo democrático.
Já a Assembleia Legislativa disse em tom crítico à reportagem veiculada pela RPC TV, afiliada da TV Globo, que o PL não libera de forma indistinta a importação de lixo de outros estados, e que essa movimentação depende do aval de órgãos ambientais.
“A legislação moderniza os parâmetros ao permitir ao Estado a gestão dos resíduos sólidos de uma maneira coordenada […] Repudia-se, portanto, qualquer alegação de que a proposta aprovada atenda interesses particulares em detrimento do interesse público”, diz trecho.
Conforme a Assembleia, a lei “busca entender o processo, da geração à destinação final, levando em conta cada etapa e detalhe da cadeia”.
As empresas MTX e Surubim não se posicionaram sobre o tema.
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