Conhecida como atriz do primeiro time da Globo, Regina Duarte aceitou o convite do presidente Jair Bolsonaro para conduzir a pasta da Cultura.
Ela afirmou à Folha de S.Paulo que vai “noivar” com o governo. “Quero que seja uma gestão para pacificar a relação da classe com o governo. Sou apoiadora deste governo desde sempre e pertenço a classe artística desde os 14 anos”, afirmou a atriz.
Regina Duarte é a quarta pessoa na cadeira e assume após um escândalo: na sexta (17), Roberto Alvim foi demitido do mesmo cargo, depois de ter postado um vídeo no qual copia trechos de um discurso de Joseph Goebbels, o ministro da Propaganda de Hitler na Alemanha nazista.
Para convencer a atriz a assumir a pasta da Cultura, Bolsonaro disse que poderia recriar o Ministério da Cultura, o que elevaria a atriz à condição de ministra -seus antecessores foram secretários. O MinC foi extinto por Bolsonaro no início do ano passado e transformado em secretaria, primeiramente vinculada ao Ministério da Cidadania e depois ao do Turismo.
A paulista é um nome central na história da televisão do país e ganhou o apelido de namoradinha do Brasil após interpretar papéis importantes em novelas da Globo durante os anos 1970 e 1980. A protagonista da série Malu Mulher (1979-1980), de veia feminista, e a famosa Viúva Porcina, de Roque Santeiro (1985-1986) são dois dos principais.
Em paralelo ao destaque na TV, também ganhou holofotes por expressar suas posições políticas -que foram ficando cada vez mais conservadoras com o passar do tempo.
A atriz fora alçada à condição de um símbolo da luta feminista, sobretudo por ter vivido uma mulher independente e divorciada na série “Malu Mulher”, numa época em que o tema do divórcio ainda era tabu na sociedade brasileira. No entanto, 40 anos depois, Regina disse que não abraça aquelas causas -ou, melhor, que nunca abraçou completamente, nem mesmo na época.
“Nunca fui feminista, mesmo fazendo Malu. Eu achava que não era por aí, que tinham caminhos intermediários, tinha que negociar mais, não podia se afastar do homem, não podia tomar posturas machistas e aconteceu muito isso”, afirmou a atriz, em entrevista a Pedro Bial no ano passado.
Essa declaração se junto a outras revisões da artista, que fez oposição ao governo do PT no período das manifestações pelo impeachtment da presidente Dilma e declarou apoio a Bolsonaro ainda durante o período de campanhas.
“Quando conheci o Bolsonaro pessoalmente, encontrei um cara doce, um homem dos anos 1950, como meu pai, e que faz brincadeiras homofóbicas, mas é da boca pra fora, um jeito masculino que vem desde Monteiro Lobato, que chamava o brasileiro de preguiçoso e que dizia que lugar de negro é na cozinha”, disse a atriz em uma entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.
HISTÓRIA
Nascida em Franca, filha de uma dona de casa e de um tenente reformado do Exército, cresceu na cidade de Campinas e conta que teve uma infância pobre.
“Sempre que preciso interpretar com emoção, busco na minha experiência de vida algo parecido que me dê um apoio para eu ser sincera”, diz a atriz num depoimento prestado ao Memória Globo, site que reúne informações sobre a história da emissora.
Regina conta que ficou fascinada pelo teatro quando leu a sua primeira peça, uma adaptação do diário de Anne Frank, numa viagem de ônibus para São Paulo. Ela diz que um jovem ator que viajava ao seu lado tinha o livro e que ela ficou filando as páginas durante o trajeto.
No começo dos anos 1960, em Campinas, ela teve sua primeira experiência com teatro estudantil. “O Auto da Compadecida”, de Ariano Suassuna, foi seu primeiro espetáculo encenado, aos 14 anos. Quatro anos depois, descoberta por Walter Avancini, foi convidada a fazer um teste para a novela “A Deusa Vencida”, na Excelsior, que trazia Tarcísio Meira e Glória Menezes no elenco. O ano era 1965.
Na Globo ela estreou em 1969, com “Véu de Noiva”, escrita por Janete Clair. Ali, fez o seu primeiro par romântico com Cláudio Marzo, o que voltaria a acontecer em “Irmãos Coragem” e “Minha Doce Namorada”, nos anos seguintes. Em 1972, seu maior sucesso, “Selva de Pedra”, novela que ela protagonizou e que também foi um divisor de águas na história da teledramaturgia da Globo.
Regina Duarte conta ao site Memória Globo que em meados dos anos 1970, com a imagem muito marcada pelos papéis de moças delicadas e comportadas, resolveu voltar ao teatro, agora vivendo uma prostituta, na peça “Réveillon”.
Em 1979, a convite de Daniel Filho, protagonizou “Malu Mulher”, outra obra emblemática, que discutiu temas como aborto, homossexualidade e emancipação feminina e se provou vanguardista num período em que o país ainda vivia sob a ditadura militar. O período também coincidiu com uma atividade engajada da atriz, que participou de atos em prol da anistia e dos atos pelas eleições diretas.
Seis anos depois de “Malu Mulher” estrear, quando a Globo pôde enfim exibir “Roque Santeiro”, que na década anterior havia sido censurada pelo governo militar, Regina viveu aquele que é um de seus papéis mais emblemáticos, a cômica Viúva Porcina.
Ainda em 1985, ela apoiou a candidatura de Fernando Henrique Cardoso à Prefeitura de São Paulo, que agradava mais à centro-esquerda, e criticou Jânio Quadros, candidato mais à direita, que acabou vencendo o pleito.
Em 1988, viveu a mãe batalhadora que é traída pela própria filha em “Vale Tudo”, de Gilberto Braga. Nas décadas de 1990 e 2000, ainda emendaria outros papéis importantes na Globo, como o da sucateira Maria do Carmo, de “Rainha da Sucata”, e três Helenas de Manoel Carlos: em “História de Amor”, em “Por Amor” -nesta última ao lado de Gabriela Duarte, sua filha, numa trama sobre troca de bebês- e em “Páginas da Vida”.
Nas eleições presidenciais de 2002, Regina Duarte participou da campanha de José Serra, do PSDB, e disse que tinha medo de uma eventual vitória do petista Luiz Inácio Lula da Silva. A atriz acabou sendo duramente criticada por seus colegas e sua participação ganhou amplo destaque na imprensa.